sexta-feira, 24 de setembro de 2010

O juiz da imprensa

Enviado por Sandro Vaia – em 24.09.2010

 

alt Lula sabe melhor do que ninguém o quanto de sua mística ele deve à imprensa. Um dos primeiros grandes perfis do herói, talvez um dos mais importantes, sobre o operário pragmático que dirigia um movimento sindical sem se atrelar aos interesses do Partido Comunista (coisa rara na época) foi escrito por Ruy Mesquita - insuspeito de progressismo - na revista “Senhor Vogue” , um ícone da imprensa cult no final dos anos 70.

Aquele líder proletário autêntico sem contaminação ideológica que começava a crescer no imaginário popular, deu, na entrevista a Ruy Mesquita, uma resposta premonitória sobre a importância que a imprensa teve para sua projeção:

-A imprensa é uma ajuda muito grande que eu tive, mas se ela deixar de existir hoje, nós vamos continuar fazendo a mesma coisa. Eu nunca fiz a coisa em função da imprensa.

Essa frase pode resumir, de certa forma, a percepção utilitária que o ex-líder metalúrgico e hoje presidente da República tem a respeito da função da imprensa numa sociedade aberta e democrática.

Nesta última semana o presidente usou seu método morde-e-assopra e, do alto dos palanques nos quais passou uma boa parte desse final de mandato, depois de fazer a ressalva de que “a liberdade de imprensa é intocável”, vociferou contra ela as suas mais rudes críticas, e liberou a senha para que as suas falanges saíssem a fazer manifestações contra o “golpismo midiático”.

O motivo da fúria presidencial: as reportagens de jornais e revistas denunciando quebras de sigilo fiscal de adversários ou tráfico de influência nos corredores palacianos,que poderiam prejudicar a trajetória de sua candidata rumo à consagradora vitória eleitoral no primeiro turno.

O que é que leva grupos de militantes movidos por preconceitos ideológicos ou pela convivência promíscua com a generosa distribuição de verbas públicas a considerar a denúncia da existência nos corredores palacianos de negociatas, propinas e tráficos de influência como “golpismo midiático” é um desses mistérios que estão acima da compreensão racional e devem ser creditados ao estado de excitação histérica provocado pelas emoções da campanha eleitoral.

Tanto os fatos são fatos que o governo os confirmou com a demissão dos envolvidos. Não é lícito acreditar o governo tenha demitido inocentes apenas por interesseiro cálculo eleitoral. A imprensa independente e profissional não fez mais do que cumprir a sua obrigação. É a mesma imprensa fazendo as mesmas coisas que os atuais críticos aplaudiam quando as denúncias eram sobre a compra de votos para a reeleição de FHC, a Pasta Rosa, o Sivam, os grampos das conversas dos articuladores da privatização da Telebrás, as denúncias de Pedro Collor contra a corrupção do governo do irmão Fernando, a compra do Fiat Elba com o dinheiro de PC Farias - etc,etc,etc. A imprensa de então, embora fosse a mesma e fizesse as mesmas coisas, não era golpista - era altiva, isenta, equilibrada e independente.

A imprensa só deve ser livre, no entendimento do presidente, quando informa “corretamente”. E só deve ser livre para ser correta, dentro do seu raciocínio, quando quem decide o que é correto ou não é ele mesmo.

Sandro Vaia é jornalista. Foi repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O Estado de São Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla) sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez.. E.mail: svaia@uol.com.br

Corumbá

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Tempos petistas

Enviado por Merval Pereira – em 23.9.2010

 

"Por ironia do destino, os militares estão organizando um evento para defender a liberdade de imprensa no mesmo dia em que os sindicatos e os movimentos sociais organizam uma manifestação para atacar a liberdade de imprensa. Os tempos mudaram". O comentário de Paulo Uebel, diretor-executivo do Instituto Milennium, é sintomático dos tempos que estamos vivendo.

O Clube Militar está realizando no Rio um painel intitulado "A democracia ameaçada: restrições à liberdade de expressão", hoje à tarde, do qual participarei com Reinaldo Azevedo, da "Veja", e o diretor de assuntos legais da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Rodolfo Machado Moura.

Na outra ponta, está programada também para hoje em São Paulo uma manifestação contra a chamada "grande imprensa", com o apoio do PT, da CUT, da UNE e várias organizações não governamentais, e os que se autointitulam "blogueiros independentes", todos, sem exceção, financiados pelo dinheiro público.

Um fato inédito em uma democracia, só registrado na antiga União Soviética — quando os sindicatos tomavam a si a tarefa de controlar seus associados para que atuassem de acordo com as diretrizes governamentais —, é que o Sindicato dos Jornalistas Profissionais de São Paulo está apoiando o movimento.

Antônio Felício, secretário sindical nacional do PT e secretário de Relações Internacionais da CUT, em artigo publicado no blog do Partido dos Trabalhadores, explicita o que seria essa conspiração, no mais puro chavismo, ou ao estilo do que o governo dos Kirchner está fazendo na Argentina.

Segundo ele, "a verdadeira ditadura do pensamento único" está sendo implantada no país pelas "oito famílias que dominam mais de 80% da mídia impressa, falada e televisionada, e seus satélites".

As ações teriam sido deliberadas "na malfadada reunião do Instituto Millenium, em São Paulo, no mês de março deste ano". E quais seriam as evidências dessa conspiração da "grande imprensa"?

As diversas reportagens publicadas recentemente denunciando tráfico de influência, corrupção e o aparelhamento do Estado com a utilização de órgãos estatais para fins políticos, como a quebra de sigilo fiscal de pessoas ligadas ao PSDB e ao próprio candidato da oposição à Presidência, José Serra, ou simplesmente para empregos de parentes e amigos em órgãos públicos.

A mais recente denúncia sobre tráfico de influência alcançou o ministro da Comunicação Social, Franklin Martins. A estatal Empresa Brasil de Comunicação (EBC), cujo Conselho de Administração ele preside, contratou por R$ 6,2 milhões uma empresa onde seu filho trabalha como representante comercial.

Também ontem se descobriu que uma filha do presidente dos Correios havia sido contratada pelo Gabinete Civil, uma prática nepotista de contratações cruzadas, já que foi Erenice Guerra quem indicou o presidente dos Correios.

São essas denúncias, que já provocaram a demissão de uma ministra de Estado e meia dúzia de dirigentes estatais, que os sindicalistas consideram exemplares da manipulação do noticiário com o objetivo de levar a eleição para o segundo turno.

Esse ambiente de tensão política está sendo alimentado pelo próprio presidente Lula, que vem desfilando de palanque em palanque, dedicado a eleger sua candidata no primeiro turno e a tentar jogar o eleitorado petista contra os meios de comunicação, que estariam unidos em uma conspiração contra seu projeto político.

A sua atuação na campanha eleitoral, que não leva em conta a ética pública nem respeita a chamada "liturgia do cargo", está sendo denunciada por um documento que foi lido ontem pelo jurista Hélio Bicudo, um fundador do PT, assinado por personalidades como o cardeal arcebispo emérito de São Paulo Dom Paulo Evaristo Arns, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Carlos Velloso e intelectuais como Ferreira Gullar.

O manifesto fala nos riscos do autoritarismo e critica a ação de grupos que atuam contra a imprensa: "É aviltante que o governo estimule e financie a ação de grupos que pedem abertamente restrições à liberdade de imprensa, propondo mecanismos autoritários de submissão de jornalistas e de empresas de comunicação às determinações de um partido político e de seus interesses".

A preocupação generalizada é com a escalada personalista do presidente Lula, que transforma em inimigos todos os que discordam de seu governo. "É constrangedor também que ele não tenha a compostura de separar o homem de Estado do homem de partido, pondo-se a aviltar os seus adversários políticos com linguagem inaceitável, incompatível com o decoro do cargo, numa manifestação escancarada de abuso de poder político e de uso da máquina oficial em favor de uma candidatura. Ele não vê no "outro" um adversário que deve ser vencido segundo regras da democracia, mas um inimigo que tem de ser eliminado".

O documento lembra as diversas ocasiões nesta campanha eleitoral em que o presidente da República escarneceu da Justiça Eleitoral, e seu propósito de eleger uma maioria para poder controlar o Senado: "É um insulto à República que o Poder Legislativo seja tratado como mera extensão do Executivo, explicitando o intento de encabrestar o Senado. É um escárnio que o mesmo presidente lamente publicamente o fato de ter de se submeter às decisões do Poder Judiciário".

O documento finaliza afirmando que é dever dos democratas, para "brecar essa marcha para o autoritarismo", combater uma "visão regressiva do processo político, que supõe que o poder conquistado nas urnas ou a popularidade de um líder lhe conferem licença para rasgar a Constituição e as leis".

Corumbá

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Governo tenta controlar Vale, uma empresa privada

Enviado por Míriam Leitão – em 22.09.2010

O mandato do atual presidente da Vale, Roger Agnelli, termina no ano que vem, e os acionistas vão tomar a decisão sobre quem será o próximo. Mas há algum tempo, o presidente Lula, pessoalmente, tem pressionado a Vale, acha que a empresa não faz as opções empresariais certas, queria que investisse mais em siderurgia no Brasil, para parar de vender matéria-prima. Mas tem de ser uma decisão tomada pela empresa, por razões profissionais, olhando as opções de mercado para o aço. Enfim, não pode ser tomada a partir do Palácio do Planalto.

Agora, o que estão falando, é que eles vão aproveitar essa mudança para que o governo interfira mais diretamente na escolha do novo presidente. Como se daria isso? Através de outro acionista, a Previ, que tem participação grande.

Mas o que interessa a todo mundo é que o governo sempre repete essa confusão: acha que um fundo de pensão pertence ao governo; não, ele é dos funcionários do Banco do Brasil; portanto, entidade de direto privado, não empresa estatal.

O governo não pode decidir isso. Pode ser que a decisão mais acertada seja essa, de investir em siderurgia, mas o que é estranho, do ponto de vista do que chamam de governança, é a insistência com que o governo quer controlar e decidir o que se passa dentro de uma empresa privada, de capital aberto, que tem muitos acionistas. Se soubesse muito bem dirigir suas empresas, não aconteceriam essas barbaridades que ocorrem, por exemplo, nos Correios.

O governo Lula tem dificuldade de entender exatamente o que é empresa totalmente estatal, empresa de economia mista e empresa privada. Mistura tudo como se fossem braços do governo. É uma distorção.

Corumbá

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Em defesa da democracia e da liberdade de imprensa

Nota assinada por Sérgio Guerra, presidente nacional do PSDB, que acaba de ser distribuída:

Merece total repúdio do povo brasileiro a tentativa de intimidação da imprensa, por parte do PT, da campanha Dilma e de setores sindicais. A convocação de um ato destinado a esse fim explicita a vocação autoritária desses apoiadores.

Não se espantam com a corrupção e com os malfeitos, queixam-se das notícias que revelam corrupção. Querem uma imprensa e uma opinião pública subordinadas. Não é coincidência que os mesmos que preconizam um “controle da imprensa” se juntem para tentar tirar legitimidade de uma vitória de José Serra.

Nunca antes na história deste país se viu tanta desfaçatez. O presidente da República apequena e mancha a investidura que recebeu para jogar-se numa aventura ilegal, subvertendo as leis e as normas básicas do jogo democrático.

Sob o pretexto da popularidade, os patrocinadores da chapa oficialista consideram-se inimputáveis. Instituíram o vale-tudo: abuso da máquina, uso de dinheiro público e violações de direitos constitucionais.

Ao convocar um ato para intimidar a imprensa, têm a cara-de-pau de evocar a democracia, quando o que querem é abalar um dos seus pilares: a liberdade de expressão e de informação.

Causa perplexidade que chamem de jogo sujo o direito à informação, ao mesmo tempo em que inundam o país com panfletos mentirosos a respeito dos adversários.

O povo brasileiro não é bobo. Não se deixará intimidar, nem se deixará levar por previsões que dão como terminada, e com resultado apurado, uma eleição em que ninguém ainda votou. Querem ganhar no grito, na pressão e na ameaça.

Não passarão. No dia 3 de outubro, longe das pressões do Poder e de seus asseclas, os eleitores brasileiros se manifestarão. Livres. Das urnas sairá a vontade popular.

Em defesa da democracia, da liberdade, em defesa de um país decente.

Corumbá

domingo, 19 de setembro de 2010

Crime e reparação

Acharam uma mamadeira e uma seringa com um pó branco (...) Os policiais disseram ser cocaína (...) Na prisão, desfiguraram meu rosto (...) Só vi o túmulo da minha filha quando comprovaram que era remédio que ela tomava


RESUMO
A desempregada Daniele Toledo do Prado, 25, de Taubaté, foi presa em 2006 acusada de matar a filha ao fazê-la ingerir cocaína. Ficou 37 dias na cadeia, onde foi agredida. Perdeu visão e audição do lado direito. Hoje, move ação de indenização contra o Estado. Quer usar o dinheiro para montar uma ONG de ajuda a crianças com doenças raras, com tinha sua filha.

ROGÉRIO PAGNAN DE SÃO PAULO

Quando o oxímetro passou a fazer píííííííííííííííí, sabia que minha filha tinha partido. Meu corpo todo gelou.
Vi a médica Érika Skamarakis caminhar em minha direção. Ela me pegou pelo braço, me arrastou para a sala de emergência e me empurrou sobre a maca onde minha filha estava deitadinha, só de calça, toda entubada. Morta.

Eu não tive reação. Ela, a médica Érika, começou a gritar. "Olha o que você fez com sua filha, assassina. Você a matou com overdose de cocaína". Eu olhava para todos, médicos e enfermeiros, mas não conseguia dizer nada. Estava em estado de choque.

Ali mesmo, na sala de emergência, um policial disse que eu estava presa.

Acharam na minha casa uma mamadeira e uma seringa. Dentro tinha pó branco, o mesmo recolhido da boca de minha filha por uma enfermeira do pronto-socorro.

Os policiais fizeram um teste nesse pó e decretaram ser cocaína. Para eles, o caso estava esclarecido: eu havia posto por maldade cocaína na mamadeira de minha filha e ela morreu de overdose.

O delegado Paulo Roberto Rodrigues chamou a imprensa. Passei a ser chamada de "monstro da mamadeira". Apareceu tudo nas TVs da cadeia para onde fui levada, lá em Pindamonhangaba.

De um grupo de 21 presas, pelo menos 12 delas passaram a espancar o "monstro" e a "vagabunda" que matou "sua própria filha". Eu ainda não conseguia falar nada. Puxaram meu cabelo, me jogaram no chão. Recebi chutes, muros e pauladas.

Quebraram minha clavícula, meu maxilar e desfiguraram todo meu rosto. Diziam que eu precisava sofrer muito antes de morrer.

Uma presa colocou uma caneta dentro do meu ouvido, com a ponta virada para o meu tímpano. Ela pretendia bater naquilo com um objeto. Uma outra presa a convenceu a parar. Ela seguiu o conselho, mas antes quebrou a caneta dentro de mim. Os funcionários me recolheram no pátio na manhã seguinte.

Não sei quantos dias fiquei desacordada no hospital. Sei que fiquei presa por 37 dias.
Desses, 28 deles passei sem ver a luz do dia, comendo bolacha de água e sal, com suco de saquinho. Tinha medo de ser envenenada.

REMÉDIO
Perdi a audição e a visão do lado direito do rosto. Ainda sinto dores e precisarei passar por novas cirurgias porque os ossos foram calcificados em posição errada.

Só consegui ver o túmulo da minha filha quando os laudos comprovaram que o pó branco, aquele que a polícia afirmou ser cocaína, era resíduo dos remédios que ela estava tomando.

Minha vida foi destruída dessa forma porque 11 dias antes de minha filha morrer, fui estuprada dentro do hospital universitário da Unitau, a Universidade de Taubaté.

Minha filha estava internada para tratamento de saúde, rotina que vivíamos havia três meses. Ela tinha uma doença rara. No seu cérebro surgiam feridas e, em razão delas, ficava inconsciente.

Os medicamentos do misterioso pó branco eram justamente para tratar isso.

Fui estuprada por um aluno-médico. Ele usou um pano com produto químico que me deixou amolecida.
Enquanto estuprava meu corpo, também violentava minha dignidade. Dizia saber que eu precisava do hospital para tentar salvar minha filha e, caso eu o denunciasse, não teria mais ajuda.

A direção do hospital pediu para que retirasse a queixa, mas não aceitei. Ofereceram até um quarto particular para ficar com minha filha.

No dia 28 de outubro de 2006, na véspera de sua morte, minha filha teve uma nova crise. Fui para o mesmo hospital universitário, como havia sido orientada antes.

Mesmo com um encaminhamento assinado por três médicos, não me deixaram entrar. Disseram ter uma ordem para que não fosse atendida ali. Corri para outro pronto-socorro, onde minha filha morreu horas depois.

FUTURO
Minha filha se chamava Victória. Dei esse nome porque a gravidez foi complicada. Sobrevivemos por milagre. Tive pressão alta, crises convulsivas e eclampsia. Ela nasceu de 7 meses. Nós ficamos internadas na UTI.

Ela morreu quando tinha 1 ano e 3 meses de idade. Ainda não sei a causa da morte.

Tento, na Justiça, que parte de todo esse meu sofrimento seja reparado. Movo uma ação de indenização contra o Estado e ainda aguardo o resultado desse pedido. Peço dinheiro.

Com ele, quero criar uma ONG para ajudar crianças com problemas de saúde - em especial aquelas com diagnóstico complicado.

Quero pagar pelos diagnósticos, oferecer assistente social e pagar pela internação. Isso custa caro.

Quero tentar dar às mães a ajuda que eu precisei, mas não tive. Que minha filha precisou, mas não teve.

Quero tentar ajudar um pouco das mães violentadas todos os dias nesse país por conta de sua classe social.

Veja postagem a respeito no Blog do Corumbá

Corumbá

Mães, Brasil e a fome

Enviado por DANUZA LEÃO, em 19/09

A FOME NO MUNDO diminuiu; boa notícia? Em termos. Saber que do 1 bilhão de pessoas que passavam fome o número baixou para 925 milhões não chega a ser um grande consolo.

Quem vê na televisão, em pequenas cidades do Nordeste, famílias morando em casebres com chão de terra batida, em volta de uma sopa rala feita numa lata de querosene, sem um pedaço de carne, ou as pobres vítimas das enchentes deixando seus barracos desmoronados, percebe que todos têm algo em comum, além da miséria: uma enorme quantidade de filhos. Mas ainda não ouvi nenhum candidato falando de controle da natalidade.

Em 1970, éramos 90 milhões (sei disso porque me lembro do hino da Copa -90 milhões em ação). Hoje, 40 anos depois, somos, segundo o IBGE, 192 milhões.
Se o número mais do que dobrou, em 2050 pode perfeitamente alcançar 400 milhões. E como alimentar, educar e dar emprego para essa gente toda que não para de nascer?

Em cada família (quanto mais pobres, mais procriam) são seis, oito, dez crianças. É preciso explicar, sobretudo às mulheres pobres e analfabetas, que é possível decidir quantos filhos querem ter. Elas não sabem que com menos filhos é mais fácil alimentar a família, porque nunca pensaram nisso.

Um programa desses é para ser feito em duas etapas: na primeira, mais educativa, explicando que existem opções; a mulher pode até mesmo não ter filho nenhum, se não quiser. Mostrar que elas têm esse direito, talvez o primeiro da vida.

Na segunda, ensinando os vários procedimentos possíveis e fornecer os meios para as mais pobres e menos esclarecidas. Diu, pílula, pílula do dia seguinte, camisinha; a escolha é vasta, e que fique bem claro: ninguém está falando em laqueadura geral.

Os países mais pobres não podem ter a ilusão de melhorar vendo sua população dobrada ou triplicada em alguns anos. Não adianta: sem o controle da natalidade país nenhum vai resolver seus problemas.

Não pode existir cidadania enquanto a panela estiver vazia e um punhado de crianças descalças, analfabetas e sub-alimentadas, sem esperança de um futuro melhor.

Adolescentes também precisam ter acesso a essas informações, para que meninas de 12, 13 anos evitem a gravidez, como é tão frequente em zonas mais carentes, sobretudo no Nordeste - e daí para a prostituição infantil e para a delinquência, é apenas um pulo. Se elas não sabem, é fatal que engravidem -ou alguém vai falar em abstinência sexual com adolescentes com os hormônios à flor da pele?

Nenhum Bolsa Família vai resolver o problema, e quando uma dessas mães olha de maneira tão triste para suas filhas, ela está pensando, sem nem saber que está pensando, que a vida delas vai ser exatamente igual à sua: miserável e sem perspectiva.

A verdadeira mãe de todos os brasileiros deveria ser Erenice Guerra - e que mãe! Ninguém jamais cuidou melhor de sua família do que a ex-ministra da Casa Civil (e foi pra ela que sobrou).

Mas Dilma não sabia de nada, claro.

danuza.leao@uol.com.br

Corumbá

Gaspari: ‘Companheira Dilma e comissária Rousseff’

Enviado por Elio Gaspari em 19/09:

Num primeiro momento, Dilma Rousseff dissera que o ‘Erenicegate’ era problema do governo, não de sua campanha.

Neste sábado (18), a candidata atualizou o bordão de Lula ‘Não sabia de Nadinha’ da Silva: “Não cheguei a tomar conhecimento”, disse ela.

Até aqui, o Brasil vinha sendo apresentado a uma presidenciável extraordinária, gerente impecável, gestora de êxitos retumbantes. Ao dizer que não sabia o que se passava ao redor de Erenice Guerra, Dilma pede para ser vista como boba involuntária, não como cúmplice espontânea.

Todo mundo tem o direito de dizer o que bem entende. Mas aquela personagem da propaganda eleitoral perdeu o nexo.

Todo mundo tem o direito de votar e eleger quem quiser. Mas tem que ter noção do que virá em seguida.

Um artigo levado às páginas deste domingo (19) pelo repórter Elio Gaspari ajuda a entender o porquê. Vai abaixo o texto:

“Segundo a superstição petista, Dilma Rousseff é uma executiva altamente qualificada. Que seja. Ela teve um loja de cacarecos panamenhos chamada ‘Pão e Circo’, no centro comercial Olaria, em Porto Alegre, mas a aventura durou 17 meses.

Fora daí, seu currículo ficou na barra da saia da viúva. Nele, embutiu um doutorado pela Unicamp que nunca foi concluído, mas deixou de mencionar sua única, banal e pitoresca passagem pela atividade privada.

Nomeada ministra de Minas e Energia, por Nosso Guia, assistiu ao loteamento de sua pasta e a ida do engenheiro Silas Rondeau para a presidência da Eletronorte. Qualificava-se com títulos da Universidade Sarney, onde teve como orientador o eletrizante empresário Fernando, filho do ex-presidente.

Em 2004, a ministra fritou o presidente da Eletrobrás, Luiz Pinguelli Rosa, engenheiro nuclear, doutor pela UFRJ, com passagens por sete universidades estrangeiras. Para o seu lugar, turbinou Rondeau, que acabou substituindo-a no ministério.

Em maio de 2007, um assistente do doutor foi preso pela Operação Navalha. Acusado pela Polícia Federal de ter recebido R$ 100 mil de uma empreiteira, Rondeau deixou o cargo. Denunciado por gestão fraudulenta e corrupção passiva, ele se tornou o sétimo ministro de Nosso Guia apanhado pelo Ministério Público.

Rondeau subiu na vida por conta da aliança política com José Sarney, Erenice foi para a Casa Civil com credenciais típicas do comissariado: a fidelidade ao aparelho petista e à comissária Rousseff. Juntas, deixaram as impressões digitais no episódio da montagem de um dossiê com as despesas de Fernando Henrique Cardoso no Alvorada.

Há dias, um cálculo da Rede Guerra de Trabalho e Emprego informava que, em 15 anos, Erenice, seus três irmãos e dois filhos passaram por pelo menos 14 cargos.

Há mais: foram pelo menos 17, distribuídos pelos setores de urbanismo, educação, saúde, transportes, segurança, energia, planejamento e pela burocracia legislativa. Israel, filho da doutora, tinha uma boquinha na Terracap e José Euricélio, irmão dela, bicou na editora da Universidade de Brasília e estava na teta da Novacap..

Corumbá