sexta-feira, 1 de abril de 2011

O certo e o errado na saída de Roger da Vale

Enviado por Miriam Leitão – 01/04

Quem ficou 11 anos na direção de uma empresa talvez já tenha cumprido o seu ciclo. A permanência muito prolongada de pessoas no governo, em companhias ou em cargos públicos é ruim, porque cria vícios. Roger Agnelli foi um excelente executivo, tomou algumas decisões controversas, mas fez uma trajetória da Vale estatal para a privada que deixou os investidores contentes.

Os acionistas que fazem parte do bloco de controle têm o direito de pensar em mudar. O governo faz parte desse bloco através do BNDESPar.

Segundo o estatuto da empresa, é preciso contratar uma empresa de heahunter, que oferecerá opções aos acionistas. Eles, então, escolheriam a melhor. Poderia ser uma solução doméstica também.

O que está errado na saída de Roger Agnelli da Vale é a maneira como foi feita. A intervenção do governo foi explícita, à luz do dia, não há dúvida sobre isso. A presidente Dilma disse que nada sabia, quando o ministro da Fazenda estava conversando com o presidente do Bradesco pedindo a cabeça do Roger.

Hoje, a Vale é uma empresa que está sob tutela governamental. O próximo presidente da empresa e a diretoria não ousarão a fazer qualquer coisa que não seja do agrado do governo, porque custa o cargo. Isso é um retrocesso horrível.

Como o governo é um dos participantes, poderia ter proposto e até convencido os outros, através do BNDESpar. O ministro ter ido conversar com o Bradesco foi horrível.

Corumbá

terça-feira, 29 de março de 2011

Dilma, a Vale e a sombra de Lula

Editorial - O Estado de São Paulo – 29/03/2011

O governo venceu, depois de quase dois anos e meio de campanha contra o presidente da Vale, maior empresa privada do Brasil, segunda maior mineradora do mundo e líder mundial na extração de minério de ferro.

Roger Agnelli deixará o posto, afinal, porque o Bradesco desistiu de enfrentar a pressão do Palácio do Planalto. Sem a rendição do banco, o governo federal não teria os votos necessários para forçar a mudança na cúpula da empresa. O acordo foi concluído em reunião do ministro da Fazenda, Guido Mantega, com o presidente do conselho de administração do Bradesco, Lázaro Brandão, na sexta-feira. O resultado já era dado como certo por fontes do governo e, portanto, não surpreendeu. Mas a disputa em torno da presidência da mineradora foi muito mais que um embate entre dois grandes acionistas. Este é o ponto mais importante, não só para os diretamente envolvidos nesse confronto, mas, principalmente, para o País.

Se houve algo surpreendente, não foi a rendição do Bradesco, na semana passada, mas sua longa resistência. Há uma enorme desproporção de forças entre o governo federal e uma instituição financeira privada, mesmo grande. Os dirigentes do banco acabaram levando em conta seus interesses empresariais e os possíveis custos de um longo confronto com as autoridades. A pressão exercida a partir do Palácio do Planalto foi "massacrante", segundo uma fonte do banco citada pelo jornal O Globo.

Ao insistir no afastamento de Roger Agnelli, a presidente Dilma Rousseff seguiu no caminho aberto por seu antecessor. Derrubar o presidente da Vale foi um dos grandes objetivos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Desde o agravamento da crise internacional, em 2008, quando a Vale anunciou a demissão de cerca de 1.300 funcionários, as pressões contra os dirigentes da empresa foram abertas. Além de se opor às dispensas, o presidente da República passou a exigir da Vale maiores investimentos em siderurgia.

Seria preciso, segundo ele, dar menos ênfase à exportação de minério e realizar um maior esforço de venda de produtos processados. Em sua simplicidade, o presidente Lula nem sequer levou em conta a enorme capacidade excedente da indústria siderúrgica, não só no Brasil, mas em escala mundial.

Mas nem é o caso de examinar o mérito das ações defendidas pelo presidente da República e por seus estrategistas. Se essa discussão valesse a pena, os argumentos teriam ocupado espaço na imprensa e os principais dirigentes da Vale com certeza os teriam examinado, com a mesma competência demonstrada ao promover o crescimento da empresa desde sua privatização. O ponto importante é outro.

O presidente Lula agiu como se fosse atribuição de seu gabinete administrar tanto as estatais quanto as grandes companhias privadas. Deu ordens a diretores da Petrobrás e censurou-os publicamente. A imprudente associação da Petrobrás com a PDVSA para construir a refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. é fruto do cumprimento de uma dessas ordens. Aliás, nem sempre os dirigentes da estatal conseguiram seguir as determinações de Lula - a preferência a fornecedores nacionais, por exemplo - porque isso comprometeria seu trabalho.

Um presidente sensato não se meteria sequer na administração de uma estatal grande e complexa. Muito menos se atreveria a ditar políticas para empresas privadas também grandes, complexas e bem-sucedidas como a Vale e a Embraer, mas a autocrítica e o sentido de proporção nunca foram grandes atributos do presidente Lula. Além do mais, sentimentos como esses acabariam facilmente sufocados pelo objetivo maior: comandar de seu gabinete várias da maiores empresas brasileiras. Se bancos federais se meteram onde não deveriam, comprando, por exemplo, participação no Banco Panamericano, foi para atender a essa concepção de poder.

A presidente Dilma Rousseff já mostrou, em mais de uma ocasião, diferenças importantes em relação a seu antecessor e grande eleitor. Neste caso, no entanto, quando se trata da fome de poder e da ambição centralizadora, a continuidade da política anterior parece garantida.

Pena.

Corumbá

domingo, 27 de março de 2011

Tensão nas obras do PAC

Editorial - O Estado de São Paulo - 27 de março

Usando métodos semelhantes aos empregados com frequência pelos sindicalistas vinculados à Central Única dos Trabalhadores (CUT), o braço sindical do PT, trabalhadores contratados para executar algumas das principais obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) paralisaram os serviços e realizaram outras ações, algumas violentas, para fazer valer suas reivindicações. Forçado a provar, ainda que indiretamente, do veneno que seu partido nunca hesitou em aplicar aos empregadores, tratados como verdadeiros inimigos, o governo do PT corre para tentar reduzir as tensões nos canteiros de obras do PAC.

Más condições de trabalho e alojamento, diferença de tratamento entre os trabalhadores, parte dos quais não tem direito a benefícios oferecidos aos demais, e salários insuficientes, entre outros problemas, alimentaram a intranquilidade nos canteiros. A tensão já resultou em revoltas - como no acampamento de Jirau, hidrelétrica em construção no Rio Madeira, no Estado de Rondônia - e greves que se estendem por diversas regiões e levaram à paralisação do trabalho de cerca de 100 mil pessoas.

Ainda não há prazo para a retomada do ritmo normal das obras de Jirau, onde um conflito não controlado pela força policial destacada para o canteiro de obras resultou em destruição de alojamentos e de equipamentos de serviços e lazer, espalhou o medo entre os alojados e forçou a remoção, para Porto Velho e outras localidades, de praticamente todos os mais de 20 mil trabalhadores que ali se encontravam.

Em outra obra do Complexo Hidrelétrico do Rio Madeira, a da Usina de Santo Antônio, os trabalhadores cruzaram os braços à espera de uma solução para o conflito em Jirau. Com a interrupção dos atos de violência em Jirau, as obras vão sendo normalizadas aos poucos em Santo Antônio. Mas a greve continua em duas outras regiões onde estão sendo executadas obras importantes do PAC, Pecém (no Ceará) e Suape (em Pernambuco).

O governo convocou para terça-feira, dia 29, uma reunião da qual devem participar representantes do Ministério Público do Trabalho, das centrais sindicais e das empresas responsáveis pelas obras. As autoridades consideram que só um acordo prévio entre os envolvidos poderá evitar a repetição dos problemas.

As centrais sindicais admitem que não têm experiência para lidar com multidões, como as que ocupam os canteiros onde é tenso o ambiente de trabalho. Há muitos problemas trabalhistas, como diferentes formas de remuneração e condições de trabalho, que distinguem os trabalhadores de uma empresa dos de outra, subcontratada da empresa principal, mesmo que desempenhem as mesmas funções. O presidente da CUT, Artur Henrique, que deve participar da reunião de terça-feira, observou que há serviços terceirizados e até quarteirizados, cada um com contratos trabalhistas específicos. "Não dá para colocar 20 mil homens trabalhando sem um mínimo de organização".

O problema ameaça ampliar-se. Dirigentes da Força Sindical, outra central convocada para a reunião com o governo, calculam que, se as obras do PAC, especialmente aquelas ligadas à Copa do Mundo de 2014 e à Olimpíada de 2016, forem executadas de acordo com a previsão do governo, em algum momento haverá cerca de 1 milhão de trabalhadores nos diversos canteiros de obras.

Esses problemas mostram que nem o governo, nem as empreiteiras, nem os sindicalistas, nem o mercado de trabalho estavam preparados para o rápido aumento do ritmo das obras em todo o País em tão pouco tempo. Em 2006, a construção empregava 1,8 milhão de trabalhadores; hoje são 2,8 milhões e a demanda é crescente. Já há escassez de mão de obra, o que provoca aumento das reivindicações por melhores condições e melhores salários.

Espera-se que, admitindo a sua inexperiência em problemas dessas dimensões, as principais centrais ajam com prudência. Se elas insistirem em disputar o controle da representação sindical nos principais canteiros, estarão levando mais lenha à fogueira.

Corumbá