segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Que risco?

Quando você pensa que, de tanto ler os clássicos, de Machado de Assis a João do Rio e a Rubem Braga, já adquiriu domínio suficiente da língua para dormir tranquilo, a mídia o atropela com novidades. Como na primeira vez que li que Fulano estava correndo "risco de morte". Pensei que tivesse lido errado.

Ninguém mais corre risco de vida, só de morte. Ou seja, não é mais a vida que está em perigo. Suponha que alguém resolva atravessar uma avenida com o sinal fechado, zanzando entre os carros. Até outro dia esse gesto poria sua vida em risco. Não mais. Hoje, segundo a nova língua - adotada por jornais, rádios, TVs, internet e o locutor da pamonha -  o sujeito corre risco de morte. Quer dizer: está ameaçado de não morrer nunca, mesmo que os carros lhe passem por cima.

Outra praga: a palavra "pontual". Era usada para descrever uma pessoa ou fato que chegava ou acontecia na hora marcada. Agora significa algo isolado, específico: "A falta de remédio no hospital xis é pontual". Um amigo me perguntou: "Quer dizer que a falta de remédio chegou na hora certa?".

E tenho gastrite no avião quando a aeromoça anuncia: "Para informações adicionais, procure nosso pessoal de terra". Ela quer dizer "para mais informações". E não consigo conter o riso ao ouvir: "Fulaninha me adicionou como sua amiga no Orkut". Note bem, adicionar não está errado - é latim para somar. Mas, da maneira como a turma o usa, é internetês castiço, traduzido diretamente do burrês.

O bom do ridículo é que ele não se enxerga. Um filme de 1929, "A Megera Domada", com Mary Pickford, baseado em Shakespeare, foi lançado em duas versões: muda e falada. Nesta última, era preciso dar um crédito na tela para as falas. O produtor sapecou: "Diálogos adicionais por William Shakespeare".

Ridículo é pouco!

baseado em texto de Ruy Castro

Corumbá

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